domingo, 7 de dezembro de 2008

Por que eu não caio no espírito?

Já fora dito aqui neste blog, e torno a repetir que o meio pentecostal é o que mais sofre com modismos e meninices. Colocar experiências pessoais acima da Palavra de Deus é um erro grave e muito comum em nosso meio.

A Assembléia de Deus continua, pelo menos oficialmente e em suas publicações, a repudiar os modismos destes últimos tempos. Agora na prática o que vemos são estas aberrações teológicas presentes, fortes e avançando cada vez mais no seio da nossa querida denominação, a qual, queiramos ou não reconhecer, é o referencial pentecostal para todas as demais igrejas protestantes do Brasil.

Dentre muitas destas invenções dos últimos dias, irei tecer um breve comentário sobre uma das mais comuns, que é o famoso “cair no poder”, ou “cair no espírito”, que é quando o crente, supostamente, está cheio do poder e do Espírito Santo, e como conseqüência disto acaba por perder o controle de suas faculdades mentais e passa a agir como se estivesse realmente sem controle, caindo no chão em virtude de tamanha glória e manifestação de Deus, ficando como que inconsciente.

Então, por que eu não caio no espírito?

Primeiramente porque não há nenhum apoio bíblico para esta prática. Em todo o Novo Testamento não vemos nenhum crente em Jesus caindo do poder ou agindo como um louco que tivesse perdido a sua consciência. O que vemos de semelhante com essas manifestações em nossas igrejas é a passagem de Mc 9:17-26, passagem que transcrevo:

“E um da multidão, respondendo, disse: Mestre, trouxe-te o meu filho, que tem um espírito mudo; E este, onde quer que o apanha, despedaça-o, e ele espuma, e range os dentes, e vai definhando; e eu disse aos teus discípulos que o expulsassem, e não puderam. E ele, respondendo-lhes, disse: Ó geração incrédula! até quando estarei convosco? até quando vos sofrerei ainda? Trazei-mo. E trouxeram-lho; e quando ele o viu, logo o espírito o agitou com violência, e, caindo o endemoninhado por terra, revolvia-se, escumando. E perguntou ao pai dele: Quanto tempo há que lhe sucede isto? E ele disse-lhe: Desde a infância. E muitas vezes o tem lançado no fogo, e na água, para o destruir; mas, se tu podes fazer alguma coisa, tem compaixão de nós, e ajuda-nos. E Jesus disse-lhe: Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê. E logo o pai do menino, clamando, com lágrimas, disse: Eu creio, Senhor! ajuda a minha incredulidade. E Jesus, vendo que a multidão concorria, repreendeu o espírito imundo, dizendo-lhe: Espírito mudo e surdo, eu te ordeno: Sai dele, e não entres mais nele. E ele, clamando, e agitando-o com violência, saiu; e ficou o menino como morto, de tal maneira que muitos diziam que estava morto”.

Percebemos pela passagem acima que quem tira a consciência das pessoas e as fazem agir como loucos são os espíritos malignos, que oprimem e anulam a razão de suas vítimas. No versículo 27 da mesma passagem, vemos a atitude que Jesus tomou após libertar o cativo: “Mas Jesus, tomando-o pela mão, o ergueu, e ele se levantou”. Jesus não derrubou o jovem, mas o colocou em pé, são e consciente.

Na clássica narrativa de Atos 2 nós não vemos o relato de nenhuma pessoa caindo ou ficando inconsciente. E quanto ao fato de alguns estarem zombando do que viam e pensarem que os apóstolos estavam embriagados (vs. 13 e 15), isto não se justifica por estarem os discípulos caindo no chão ou agindo como loucos, mas pelo fato dos mesmos estarem falando em outras línguas (vs. 7-12).

E o que falar da passagem da transfiguração no monte (Mt 17:1-8)? Oras, em um momento tão glorioso quanto àquele, onde Jesus se transfigurou em glória, teve a presença de Elias e Moisés, uma nuvem gloriosa cobriu o lugar e a voz de Deus se fez ouvir fisicamente, nós não vemos em momento algum, mesmo em tamanha glória, nem Pedro, Tiago ou João caindo do poder ou ficando inconscientes. Eles ficaram conscientes a todo tempo do que viam, tanto é que depois relataram o ocorrido, fazendo com que o mesmo fosse escrito com detalhes em três evangelhos.

E alguns questionam a passagem de 2 Cr 5:14, que diz que “os sacerdotes não podiam permanecer em pé, para ministrar, por causa da nuvem; porque a glória do SENHOR encheu a casa de Deus”. Primeiramente trata-se de uma passagem isolada em toda a Bíblia, sem nenhuma sistemática bíblica que a autorize a formar uma doutrina. Observe-se também que fora um momento específico, bem como o versículo não afirma que os sacerdotes ficaram inconscientes ou que caíram no chão como que tivessem sido nocauteados, como vemos hoje em dia. Na verdade, o que ocorreu com os sacerdotes em 2 Cr 5:14 fora o mesmo que aconteceu com Ezequiel em Ez 1:28 “Como o aspecto do arco que aparece na nuvem no dia da chuva, assim era o aspecto do resplendor em redor. Este era o aspecto da semelhança da glória do SENHOR; e, vendo isto, caí sobre o meu rosto, e ouvi a voz de quem falava”, ou seja, a glória foi tão grande que Ezequiel não pôde permanecer em pé, mas caiu sobre o seu rosto, i.e., prostrou-se (e não caiu) perante tão grande glória de Deus, humilhando-se assim perante Deus e reconhecendo o seu poder (cf. Lc 24:5; Ap 22:8). A própria passagem supracitada da transfiguração, especificamente em Mt 17:5,6, lemos que “E, estando ele ainda a falar, eis que uma nuvem luminosa os cobriu. E da nuvem saiu uma voz que dizia: Este é o meu amado Filho, em quem me comprazo; escutai-o. E os discípulos, ouvindo isto, caíram sobre os seus rostos, e tiveram grande medo”, o que só vem confirmar o entendimento bíblico exposto. Em suma: os sacerdotes não caíram ou foram derrubados, mas prostraram-se diante do poder e da glória de Deus.

Por fim, o ordenamento doutrinário do Novo Testamento sobre o assunto encontra-se registrado em seu ápice em 1 Co 14 (todo o capítulo), onde Paulo trata diretamente e com louvor do assunto em questão.

Anchieta Campos

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