sábado, 22 de agosto de 2009

Bênção apostólica?

A chamada “bênção apostólica” não é nenhuma novidade no meio evangélico. Ela é tão comum e conhecida como a tradicional leitura feita nos cultos de Santa Ceia (1 Co 11:23-34). Mas, assim como os católicos se prostram diante das imagens sem saber o fundamento de tal prática, do mesmo modo os evangélicos curvam as suas cabeças e abrem suas mãos estendidas em direção ao céu para receberem a dita bênção.

A bênção apostólica é proclamada sempre ao final de cada culto, sendo que somente o pastor local é quem tem a “competência espiritual” para “impetrá-la”. A mesma nada mais é do que o versículo final da segunda carta de Paulo aos coríntios “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo seja com todos vós. Amém” 2 Co 13:13; palavras estas que são simplesmente uma oração de Paulo clamando em favor dos mesmos.

No que pese o seu valor espiritual, por se tratar de uma oração proferida em nome da Trindade, a qual ainda engloba em sua petição três fatores fundamentais na vida de qualquer cristão (graça divina, amor divino, e comunhão divina), a referida “bênção”, nos moldes como vemos ela hoje sendo praticada nos cultos evangélicos, não passa de uma prática sem o menor respaldo neo-testamentário.

Não quero aqui ser contencioso, nem mesmo ser o causador de uma mudança de prática eclesiástica, mas tão somente fazer um esclarecimento bíblico, para que assim cada crente possa conhecer melhor uma prática tão comum em nosso meio.

Essa “bênção apostólica” (ou oração) nada mais é do que uma herança do catolicismo romano, a qual remonta em sua origem para a bênção aarônica (ou araônica, também conhecida entre os judeus como Nesiat Kapayim, i.e., estender as mãos), assim chamada a bênção descrita em Nm 6:23-27. Assim se expressou o Papa Leão XIII em sua Carta Encíclica Inscrutabili Dei Consilio:

“A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, a caridade de Deus e a comunicação do Espírito Santo sejam com todos vós (2 Cor 13, 13), Veneráveis Irmãos, e é de todo coração que, a Vós e a cada um em particular, bem como aos Nossos caros filhos o clero e os fiéis de vossas Igrejas, concedemos a bênção apostólica como penhor da Nossa especial benevolência e como presságio da proteção celeste”.

Na verdade todos os cristãos estão autorizados a abençoar e a orar por quem quer que seja (At 12:5; Rm 12:14; Ef 6:18; Cl 4:2,3), diferentemente da Antiga Aliança, onde havia a figura do sacerdote como o principal responsável pelo ministério da oração e da ministração da bênção (cf. Lv 9:22; Dt 21:5; Js 8:33; 1 Cr 23:13; 2 Cr 30:27). Destaque-se que na Nova Aliança todos os crentes são como sacerdotes (Ap 1:6, cf. 5:10), o que implica dizer que todos tem a competência para exercer o ofício da oração e da ministração da bênção.

Esclareça-se, ainda, que não somos nós em si que abençoamos, mas, como já exposto, apenas oramos pedindo uma bênção sobre alguém (podendo Deus conceder a mesma ou não), haja vista que “Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação” Tg 1:17, cf. Nm 6:24 e Rt 2:4. Portanto, nenhum crente, independentemente do cargo eclesiástico que ocupa, é detentor de uma unção especial para conceder determinada bênção em detrimento da incapacidade espiritual dos demais. Crer que somente o pastor de uma igreja local é quem tem autoridade para conceder determinada bênção é o mesmo que estar colocando nele a origem da mesma, dando a ele a posição de detentor e distribuidor da bênção, o que contraria o acima exposto.

As palavras de 2 Co 13:13 recitadas ao final de cada culto não podem ser tidas como palavras milagrosas ou mágicas. Lembremos que Deus condena a repetição de palavras na oração (Mt 6:7), bem como que Paulo não repetiu no encerramento de nenhuma outra carta a oração de 2 Co 13:13. Além do mais, antes das palavras em si que são usadas para se pedir algo, a fé é bem mais importante em uma oração (Hb 10:22, Tg 1:6,7).

A referida “bênção apostólica” não é uma bênção especial, mais nobre do que as demais orações abençoadoras, mas tão somente é um apego literal a uma passagem do Novo Testamento. Sua prática e observação não vem a ser um pecado em si, pois, como já dito, a ordem bíblica é para sempre “abençoarmos” (i.e., pedirmos a bênção sobre alguém), e creio que a fé e a boa intenção das pessoas envoltas na “bênção apostólica” acabam-na tornando eficaz em alguns casos.

Então a mesma deve acabar? Não digo que sim, e nem digo que não. Digo que cada igreja deve ter ciência da verdade bíblica aqui exposta, e assim decidir o que achar melhor, ou simplesmente deixar que o tempo e o costume digam o que deverá acontecer com a “bênção apostólica”.

Mas que a referida “bênção”, como a vemos hoje no final de cada culto, foge da sistemática bíblica, isso é um fato inconteste!

Anchieta Campos

14 comentários:

Gláuber disse...

Mas que essa benção é linda, é!

Anchieta Campos disse...

Caro amigo e irmão Gláuber, a paz do Senhor.

Também a acho linda.

Abraço.

Anchieta Campos

Anônimo disse...

Anchieta

Fiz um questionamento para o Clóvis, do blog 5 solas depois de um questionamento sob a doutrina calvinista, e gostaria de sua opinião sobre minha conclusão. http://cincosolas.blogspot.com/2009/08/verdade-e-mais-preciosa-que-o-tempo.html?showComment=1250482369859#c7191002587374356650
Agora cheguei a seguinte conclusão, levando em conta, a lei de causa e efeito:

Arminianos
Causa: Sacrifício de Cristo
Efeito: Salvação de todos que nele crer.

Calvinistas
Causa: Eleição
Efeito: Sacrifício de Cristo para salvação de todos eleitos.

Estou certo na minha observação? Me dê a sua opinião sobre isso?

Em Cristo

Sousa

Anchieta Campos disse...

Caro irmão Sousa, a paz do Senhor.

O irmão Clóvis é praticamente um amigo meu. Já trocamos muitas idéias, principalmente em relação ao tema livre arbítrio e predestinação, onde concluímos termos mais afinidades do que discordância. Ele é um irmão sábio e moderado; um verdadeiro exemplo de um cristão que ama a Palavra de Deus.

Li suas palavras, e neste particular, concordo com sua conclusão resumida em seu comentário acima.

Deixo o links de algumas conversas que tive com o irmão Clóvis:

http://anchietacampos.blogspot.com/2008/11/debates-soteriolgicos-livre-arbtrio-x_8412.html

Ainda sobre o tema, deixo também o seguinte link:

http://anchietacampos.blogspot.com/2008/12/mais-debate-sobre-livre-arbtrio-x_8679.html

Que Deus te abençoe cada vez mais.

Abraço e obrigado pela visita e confiança.

Anchieta Campos

Genislene Borges disse...

Bom dia Anchieta Campos!
Descobri o seu blog por acaso e gostei muito.
Deus o abençoe.
Genis.

Anchieta Campos disse...

Nobre irmã Genis, a paz do Senhor.

Muito me honra a sua aprovação. Deus seja louvado por isso.

É um feliz acaso também poder ter acessado seu blog, onde contemplei um trabalho bem interessante.

Deus a abençoe cada vez mais.

Abraço.

Anchieta Campos

Jonatas disse...

A Paz do SENHOR!

Gostei muito do seu comentário. Só gostaria de resaltar que: A benção sacerdotal de Números 6:22-26, foi dada pelo SENHOR como forma de abençoar os filhos de Israel.
No versículo 27, o SENHOR promete abençoa-los através dessas palavras.

Caminhos de Libertação disse...

Parabéns pelo Blog Anchieta. De fato a ministração da benção apostólica no culto não tem base escriturística e é uma herança do catilicismo romano. A ministração da benção convedida exclusivamente aos pastores, é uma maneira sutíl de demosntar autoridade e poder sobre as ovelhas de Jesus, visto que os membros comuns não tem tais previlégios. não apoio e tenho séria dificuldades em compartilhar com essa práica não bíblica. Como você mesno disse, todos podem e devem abençoar uns aos outros livres de qualquer hierarquia. Abraço

Anchieta Campos disse...

Obrigado pela participação, nobre Marcos Aurélio.

A paz do Senhor.

Anchieta Campos

Vinícius Peixe disse...

Caro Anchieta,

Li o seu artigo e achei muito interessante.

Que Deus continue te abençoando neste ministério!!!

Anchieta Campos disse...

Nobre Vinícius Peixe, saudações em Cristo.

Muito obrigado por sua participação e palavras. Deus seja louvado sempre em nossas vidas!

Abraço.

Anchieta Campos

Patrick de Oliveira disse...

Irmão Anchieta a paz!

Eu sou totalmente contra a benção apostólica, acho que isso já se tornou ritual e totalmente idólatra. Quero saber se o irmão é contra ou não? por vc acabaria ou não?

Anchieta Campos disse...

Irmão Patrick, a paz do Senhor.

A questão da bênção apostólica permanecer ou não é irrelevante. Como falei no artigo, cabe a cada igreja local deliberar sobre isto.

Ela não vem a ser uma heresia, mas apenas demonstrei que a mesma não tem respaldo bíblico nos moldes como muitas vezes é compreendida.

Em Cristo.

Jefferson S. R. Oliveira disse...

Paz do Senhor Jesus Cristo irmão!
Compartilho da mesma linha de raciocínio que o senhor.
Quando eu estava na católica romana, lembro que ensinavam mandamentos de Deus e os da "igreja católica romana" e um desta era não sair da missa antes do fim.
Penso que a referida benção apostólica no meio cristão (protestante/evangélico) também tem servido para segurar os fiéis até o fim do culto, a final de contas ninguém gostaria de ir embora sem o tal bênção apostólica. Então, coitados dos irmãos que precisam sair antes do término da reunião (culto) para ir trabalhar por exemplo.

Agradeço pela explanação e referências bíblicas.

Que Deus te abençoe com todas as bençãos espirituais!
Jefferson Oliveira