domingo, 3 de maio de 2009

Em defesa da pregação expositiva

“E, começando por Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras” Lc 24:27.

Bem, que a igreja evangélica brasileira (e não somente a ‘canarinha’) não está lá essas coisas, isto já sabemos faz tempo. Já apontei aqui neste símplice espaço várias causas para este quadro clínico nada saudável, bem como vários efeitos, tanto na doutrina como nas práticas costumeiras, que atingem o hoje gigantesco seio cristão reformado.

Neste sucinto artigo (estou tentando ser cada vez mais objetivo em minhas palavras) irei abordar mais um assunto de extrema relevância para a igreja cristã, sendo o mesmo um fator determinante na qualidade de qualquer denominação protestante. Refiro-me a pregação expositiva, notadamente como uma marca necessária para se ter uma igreja verdadeiramente saudável, ortodoxa.

Pois bem, sem muitas delongas, eu pergunto: onde está a pregação expositiva em nossos púlpitos? Por que as pregações triunfalistas, proféticas, “pentecostais”, do reteté, transcendentais, são sempre mais presentes em nosso meio? Pior ainda, será que pelo menos a grande maioria dos pregadores contemporâneos sabem o que é uma pregação expositiva? E o que mais me preocupa é que estas pregações tem hoje preferência sobre pregações expositivas justamente porque a grande massa evangélica prefere àquelas. O que vemos hoje é uma situação em que os pregadores são moldados pelo público, pelos seus desejos e vaidades pessoais, e não o contrário, o que seria, pelo menos em tese, um modelo mais ideal de cristianismo (pela premissa de que os pregadores são dotados de um conhecimento bíblico mais apurado que o dos ouvintes).

A pregação expositiva, tão rara em nosso tempo, é o modelo de pregação vivenciada em toda a Bíblia, notadamente no Novo Testamento. Ela fora praticada tanto pelos discípulos e apóstolos, bem como pelo próprio Cristo. Essa pregação se baseia fundamentalmente na exposição organizada/sistemática da Palavra de Deus para o público ouvinte, fazendo com que ela, a Palavra, seja o centro da pregação, o que, por conseguinte, redundará em apresentar a Cristo como o centro da mensagem, o que resultará em conversões de almas e renovação para o povo de Deus, além de formar crentes verdadeiramente firmados na rocha, que é Cristo (Rm 9:33; 1 Pe 2:8; At 4:11), sendo Cristo a Palavra de Deus (Jo 1:1,14; Ap 19:13). As pregações triunfalistas, proféticas, “pentecostais”, do reteté, transcendentais, apresentam o homem como o centro da mensagem (mesmo que seja camufladamente), o que chamamos de pregação antropocêntrica; são pregações que dão uma falsa esperança ao crente, um avivamento enganoso, que se desfaz instantes após o término do culto, que levantam o “eu” em detrimento da soberana e melhor vontade de Deus, que dá força aos sonhos vaidosos do homem em detrimento da eterna e absoluta vontade de Deus para o mesmo, a qual se apresenta notadamente no projeto de vida eterna, o que finda por gerar crentes materiais, apegados a este mundo, corrompendo assim seus entendimentos, o que resulta, por fim, em uma grande massa evangélica doente espiritualmente, sem discernimento bíblico algum, facilmente levada por qualquer modismo, seja ele doutrinário ou costumeiro/consuetudinário. É um efeito dominó que pode até parecer complexo, mas é simples, e bastante destrutivo.

Filipe e o Eunuco Etíope
A passagem de At 8:26-35, a qual relata a conversão do Eunuco Etíope através da pregação do evangelista Filipe, é um exemplo de pregação expositiva. Vejamos o texto citado:

“E o anjo do SENHOR falou a Filipe, dizendo: Levanta-te, e vai para o lado do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que está deserta. E levantou-se, e foi; e eis que um homem etíope, eunuco, mordomo-mor de Candace, rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todos os seus tesouros, e tinha ido a Jerusalém para adoração, regressava e, assentado no seu carro, lia o profeta Isaías. E disse o Espírito a Filipe: Chega-te, e ajunta-te a esse carro. E, correndo Filipe, ouviu que lia o profeta Isaías, e disse: Entendes tu o que lês? E ele disse: Como poderei entender, se alguém não me ensinar? E rogou a Filipe que subisse e com ele se assentasse. E o lugar da Escritura que lia era este: Foi levado como a ovelha para o matadouro; e, como está mudo o cordeiro diante do que o tosquia, Assim não abriu a sua boca. Na sua humilhação foi tirado o seu julgamento; E quem contará a sua geração? Porque a sua vida é tirada da terra. E, respondendo o eunuco a Filipe, disse: Rogo-te, de quem diz isto o profeta? De si mesmo, ou de algum outro? Então Filipe, abrindo a sua boca, e começando nesta Escritura, lhe anunciou a Jesus” At 8:26-35.

Vejam bem a abordagem de Filipe para o Eunuco: “Entendes tu o que lês?”. Filipe estava preocupado com o entendimento bíblico do Eunuco, pois sabia que se o mesmo entendesse o que lia, isto seria fator fundamental para a conversão dele. E mais interessante ainda foi a resposta do Eunuco: “Como poderei entender, se alguém não me ensinar?”. Que lindo! Que maravilhoso! Vemos uma conversão genuína a Cristo tomando forma, e sendo formada por dois pilares fundamentais: entendimento e ensino! Mas entendimento e ensino de que? A resposta é confirmada no próprio texto: “Então Filipe, abrindo a sua boca, e começando nesta Escritura, lhe anunciou a Jesus”. Vemos que todo o processo de conversão do Eunuco foi totalmente baseado na Palavra de Deus, e não somente em Isaías, mas em todo um conjunto e sistemática bíblica, que é o que fica implícito na sentença “e começando nesta Escritura”, sendo confirmado pelo fato de Filipe ter pregado/ensinado até mesmo sobre o batismo (vs. 36-38). Não vemos Filipe profetizando, falando línguas, plantando bananeira, dando um “kame-rame-rá”, caindo no chão, não! Vemos Filipe ensinando a Palavra para o Eunuco, e como conseqüência disto, vemos a conversão do mesmo a Cristo.

Paulo em Tessalônica
“E PASSANDO por Anfípolis e Apolônia, chegaram a Tessalônica, onde havia uma sinagoga de judeus. E Paulo, como tinha por costume, foi ter com eles; e por três sábados disputou com eles sobre as Escrituras, expondo e demonstrando que convinha que Cristo padecesse e ressuscitasse dentre os mortos. E este Jesus, que vos anuncio, dizia ele, é o Cristo. E alguns deles creram, e ajuntaram-se com Paulo e Silas; e também uma grande multidão de gregos religiosos, e não poucas mulheres principais” At 17:1-4.

Aqui presenciamos o maior nome do cristianismo de todos os tempos, o do apóstolo dos gentios, Paulo, grande evangelista, doutrinador e teólogo da Igreja Cristã, em ação evangelizadora. E em que se baseou a pregação de Paulo? Como não poderia ser diferente, Paulo apresentou Cristo aos judeus através do fundamento das Escrituras. Mas Paulo não fez uso indiscriminado e aleatório das Escrituras, irracional, mas fez uso correto, inteligente, organizado e sistemático. Esta verdade fica clara na sentença “... disputou com eles sobre as Escrituras, expondo e demonstrando...”; oras, Paulo demonstrou a razão da fé cristã da melhor maneira que poderia, qual seja, testificando a fé cristã através das Escrituras, “expondo e demonstrando” pelas Escrituras o atestado de veracidade do cristianismo. E qual foi o resultado da pregação bíblico-expositiva de Paulo? Conversão de almas! “E alguns deles creram, e ajuntaram-se com Paulo e Silas; e também uma grande multidão de gregos religiosos, e não poucas mulheres principais”. Mais uma vez vemos a pregação expositiva e racional da Palavra sendo o fator fundamental para conversão de almas.

Jesus

O Mestre, o Rei, o Senhor, o Salvador, o Divino Jesus, como não poderia ser diferente, sabia que a pregação expositiva é o método correto para se ter crentes firmados na Palavra, e, conseqüentemente, um cristianismo saudável e verdadeiramente ortodoxo. A máxima da doutrina da pregação expositiva é de autoria direta do próprio Cristo, em uma síntese brilhante sobre o tema, registrada pelo médico Lucas sob inspiração divina: “E, começando por Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras” Lc 24:27. Simplesmente perfeita esta sentença! Vejam a perfeição da construção deste versículo! Uma progressão sistemática bíblica simplesmente completa. “... começando por Moisés...”, clara alusão ao Pentateuco; “... por todos os profetas...”, definição que abrange tanto os livros poéticos quanto os profetas (maiores e menores); e encerra com “... explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras...”, onde fecha com chave de ouro a demonstração de uma prática da pregação expositiva, explicando por meio de todas as Escrituras (exposição e sistemática) o fundamento da fé cristã. Ver Lc 24:44.

Achou pouco? Dentre muitas outras referências temos a pregação expositiva de Pedro em At 2:14-36, tendo como resultado o descrito em At 2:37-41, bem como a pregação expositiva do também Pedro em At 3:12-26, tendo como fruto o descrito em At 4:4.

Portanto, a igreja evangélica precisa, como um todo, mas principalmente o meio pentecostal e neo-pentecostal, voltar a dar voz e vez a pregação bíblico-expositiva, rejeitando as pregações triunfalistas, proféticas, “pentecostais”, do reteté e transcendentais, as quais nada tem a oferecer ao povo de Deus, a não ser a satisfação momentânea das vaidades individuais e prazeres materiais. É algo difícil, haja vista a corda já ter sido esticada demais, mas é algo necessário, e que com certeza será o melhor para o povo de Deus.

Anchieta Campos

4 comentários:

Prof. Israel Lima disse...

É sempre bom estar aqui neste seu espaço!
E agradecer a você por seguir o meu blog.
Peço-lhe encarecidamente a sua visita em meu blog no intuito de merecer o seu voto (em meus selos de participações). Vote e faça um blog que fala de EDUCAÇÃO estar junto dos demais blogs.
Grato pela cooperação,
Prof. Israel Lima

Anchieta Campos disse...

Caro Prof. Israel Lima, saudações fraternas.

É um prazer seguir um espaço de qualidade como o seu.

Estarei visitando seu blog, e com certeza colaborando no que estiver ao meu alcance. Educação é o que o Brasil precisa, bem como o meio evangélico também, mais do que nunca.

Abraço.

Anchieta Campos

Josiel disse...

A paz do Senhor!

Até parece que você estava presente no culto de ontem a noite aqui em Birigui.Sem mais comentários.

Abraços

Josiel

Anchieta Campos disse...

Prezado e paciente (risos) irmão Josiel, a paz do Senhor.

Como a Bíblia daqui é a mesma daí, realmente é possível que algo parecido tenha sido exposto em sua amada igreja. E isso é muito bom, pois mostra que além da mesma Bíblia, temos o mesmo Deus, bem como crentes em comum com o desejo de servir corretamente ao Senhor Jesus.

E... quem sabe um dia estarei presente em um culto aí em Birigui? Seria um prazer, bem como termos sua amada visita por aqui.

Forte abraço.

Anchieta Campos